quinta-feira, 1 de maio de 2008

Francisco Lázaro (1888-1912)

Na sua curta carreira como atleta, Lázaro obteve uma primeira vitória importante em 1908, na chamada "Maratona Portuguesa", uma corrida de 24 km. Em 1909 não competiu, devido a problemas de saúde. Regressou em 1910, triunfando na primeira maratona realizada em Portugal numa distância próxima da olímpica (42,8 km), registando 2:57:35 e deixando o 2º classificado a 15 minutos. No ano seguinte, Lázaro venceu de novo, desta vez com o tempo de 3:09:57, passando a gozar de enorme popularidade junto do público. O ano (olímpico) de 1912 começou da melhor maneira para o fundista lisboeta, que registou um "tempo-canhão" na maratona, ao fazer em 2:52:08 um percurso de 42,2 km particularmente difícil por incluir estradas esburacadas e a subida da Calçada de Carriche. Como, quatro anos antes, em Londres, o vencedor da maratona olímpica tinha registado um tempo à volta das 2 horas e 55 minutos, os portugueses logo viram em Lázaro um sério candidato à vitória em Estocolmo. Sem treinador (no país não existiam técnicos), a preparação do atleta para os Jogos Olímpicos de 1912 – os primeiros em que Portugal participou - ficou entregue a si próprio. Acabado o trabalho, Lázaro corria todos os dias de Benfica até S. Sebastião da Pedreira, desafiando, no percurso inverso, os eléctricos. Os Jogos de Estocolmo – realizados entre 5 de Maio e 27 de Julho de 1912 - revelaram uma boa organização, numa competição em que participaram 2.407 atletas de 28 países (pela primeira vez representando os 5 Continentes) disputando 102 provas. A representação portuguesa foi confiada aos atletas Armando Cortesão, António Stromp e Francisco Lázaro, aos lutadores Joaquim Vital e António Pereira e ao esgrimista Fernando Correia, sob a chefia deste último, que também desempenhou funções de dirigente. Na cerimónia de abertura dos Jogos - que constituíram a V Olimpíada da era moderna - Portugal desfilou entre a Noruega e a Rússia. Lázaro transportou a bandeira nacional. À medida que as provas decorriam, os portugueses iam coleccionando desilusões, apesar de Cortesão e Pereira terem dado boa conta de si. Veio enfim a maratona, a prova onde os portugueses esperavam a medalha de ouro para Francisco Lázaro. Na véspera, os concorrentes foram submetidos a uma rigorosa inspecção médica, que rejeitou alguns dos candidatos; Lázaro passou, com nota de "bom". A maratona realizou-se a 14 de Julho de 1912, um domingo.
Francisco Lázaro almoçou às 10 horas. Estava confiante. Pouco depois, foi levado de automóvel para o estádio, dirigindo-se imediatamente para o balneário. O calor era sufocante: 32o à sombra. Com quase todos os atletas já em exercícios de aquecimento na pista, Lázaro não aparecia. Preocupados, Cortesão e Vital correram para o balneário e nem queriam acreditar: Lázaro estava a untar o corpo com sebo!É de referir que ao tempo, o problema de "emborcação" (fomentação com um líquido oleoso na parte enferma de um corpo) era muito comum entre os atletas de pedestrianismo e de ciclismo. Por isso, aquela não tinha sido certamente a primeira vez que Lázaro se untava com aquele tipo de emborcação, que se acreditava "assegurar a elasticidade e perfeita mobilidade dos músculos de que se exigem os esforços mais efectivos, tornando-os insensíveis à dor e à fadiga, e evitar tanto quanto possível as caibras (...)".
De qualquer das formas, Lázaro não teve em conta a temperatura de mais de 30º a que iria correr. Quiseram limpá-lo, metendo-o debaixo de um chuveiro, mas já era tarde. Só houve tempo para empurrar Lázaro para fora do balneário. E ele lá foi correr a maratona todo besuntado, com os poros da pele tapados, o que impedia a transpiração cutânea nessa parte do corpo. Alem disso, apresentou-se de cabeça destapada perante um sol de rachar, no que foi acompanhado apenas pelo maratonista japonês, entre 71 concorrentes! Lázaro começou bem a corrida de 42,2 km, na cabeça do pelotão. Os restantes 5 portugueses foram estrategicamente colocados ao longo do percurso, para ajudarem Lázaro. Ao km 15, ao passar por Vital, Lázaro era 27º, com um atraso de 4 minutos para o líder da prova. Mas o atleta luso estava fresco e corria muito à vontade. Ao km 25, quando passou novamente por Vital, era 18º, mas seguia de muito perto os homens da frente. Disse que estava bem, apenas com sede, tendo bebido sofregamente a água que lhe foi dada. No km 35, Pereira e Stromp aguardavam pela passagem de Lázaro, que nunca mais chegava, deixando-os preocupados. Também alarmados, Cortesão e Fernando Correia, que estavam no estádio, entraram numa viatura e cumpriram, no sentido inverso, todo o percurso, sem encontraram sinal de Lázaro. Até que a triste notícia lhes foi dada por António Feijó, embaixador na Suécia: ao km 29; Lázaro tinha cambaleado, caído por várias vezes e por várias vezes se levantado para continuar a prova, até cair para não mais se levantar. Francisco Lázaro terá entrado em desequilíbrio hidro-electrolítico irreversível e, consequentemente, em colapso. Levado para o hospital, viria a falecer às 6, 30 da manhã do dia seguinte. Reza a história que, antes da partida, Lázaro afirmou solenemente: "ou ganho ou morro". E assim se cumpriu o destino.
In "Jogos Olímpicos, 1896 Atenas 2004", Quid Novi, 2004
José Luís Peixoto autor de "Cemitérios dos Pianos"
"A personagem baseia-se apenas circunstancialmente na história do atleta, que sempre me fascinou e que abalou o país devido à sua morte trágica", acrescentou José Luís Peixoto, para quem "Francisco Lázaro simboliza uma determinada perspectiva de Portugal: país capaz de grandes entusiasmos mas também de grandes desânimos colectivos".

5 comentários:

jmagro disse...

Infelizmente há vários casos de atletas profissionais e amadores, que recorrem a métodos de treino ou outros e suplementos ou aditivos alimentares, que pensam ser melhor para um rendimento mais positivo, mas que se revelam ser prejudiciais para o tal rendimento desportivo e ainda pior ,más para o corpo humano,debilitando-os e em casos extremos até á morte.
Todos nós q corremos,profissionais ou amadores apesar de ser natural desejarmos fazer e alcançar algo sempre mais exigente a nivel de resultados,e para isso indo desafiando os nossos limites,temos de ter consciência de que nem todos os métodos e esforços são válidos e benéficos para o nosso bem estar e existência fisica mesmo em casos mais extremos.
Ir mais longe,desafiar-nos a fazer melhor sim,a qualquer custo definitivamente não!

luis mota disse...

Olá Fátima!
Infelizmente ainda há pessoas que pensam que conseguem alterar as suas capacidades motoras através de métodos e pequenos truques. Enganam-se. O treino é a única forma de elevar as referidas capacidades. Sem dúvida que podemos recorrer á medicina desportiva, Fisiologia do esforço, psicologia…, mas acompanhados por profissionais capazes.
Em Constância, antes da prova de infantis, pedia uma pequena menina açúcar ao treinador. Este retirou logo do bolso vários pequenos pacotes que distribuiu pelas colegas. Se funciona, não sei, as atletas tiveram uma má prestação. Quem as enganou?
Será que estão realmente capacitadas das suas reais capacidades? Será que pensam que com trabalho, bem orientado, conseguimos melhorar as nossas capacidades?
Infelizmente, situações como esta levam à desmotivação e ao abandono precoce.
Para estes treinadores aconselho a leitura do livro de Francisco Sobral: “ Nenhuma medalha vale a saúde de uma criança”.
Hoje enquanto aquecia em Vale de Figueira, estava uma equipa inteira bebendo uma bebida de parece dar Asas!
A voar só vi o Alcino Serras, que venceu a prova e uma avioneta, que sobrevoava a região.
Luís Mota

jmagro disse...

Caro Luis Mota lá voar ele voou mesmo, para o duplo pódio do escalão e da geral.De resto não se viu mais aves raras a sobrevooar a região além da dita avioneta.
O treino regular,com empenho e critério é a grande mola de todo e qualquer resultado obtido ou a obter, e não falsas "poções mágicas" que acabam sempre por trazer más consequências a nivel fosico e de saúde,se não for a curto prazo, aparecerão a médio ou longo prazo certamente.

Abraço
José Magro

CORREDOR " X " disse...

Que trágica história, realmente comovente.
Aquí no Brasil um triatleta com índive elevado, um dos 5 melhores do Brasil, e ainda muito novo morreu treinado........bebia quase um litro de café antes e depois dos treinos........não se importava com o diagnóstico de cardiopatia de exames anteriores

Unknown disse...

gostei... mas Carlos Lopes é Carlos Lopes